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Morrostock 2015 – O quinto dos infernos é aqui!

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Por: Roberto Panarotto

Todas as vivências se perdem no escuro das palavras mal escritas. Nenhuma lanterna de celular é suficientemente suficiente para capturar o brilho da noite com chuva. Nenhum espaço é suficientemente pequeno que não caibam muitas pessoas compartilhando as mesmas loucuras. Nem foto, nem filmagem reproduzem a realidade enlameada que vivemos no Morrostock 2015.

Não tem como, mas a minha burrice crônica insiste e eu vou tentar relatar o que aconteceu.

A lógica: Festival de loucos. Os loucos que por um motivo ou outro não fazem parte da família brasileira. Ninguém quer esse tipo de gente por perto.

O Demétrio, que foi com o com Leandro “benga” Blessman e o Diego Dourado até o evento, contam que ao chegar em Capela de Santana avistaram luzes, música e uma festa acontecendo, resolveram parar pra pedir informação e ver se era ali o festival.

A mulher de maneira enfática respondeu fazendo o sinal da cruz: Aqui é a festa da família a outra é a festa dos sem família e a gente não sabe onde fica.

Com isso dá pra entender que estávamos indo pro inferno. Segundo ponto de vista das senhoras carolas numa festa religiosa, num feriado religioso, encostadas na cruz e chamando os outros de violento.

O local: Que precisou mudar de residência e a galera até pergunta: Mas por quê?

Simples, quem manda na cidade, não quer. E como quem manda nas cidades faz parte da tradicional “família brasileira”, é mais simples ainda, “família brasileira” não quer pessoas com ideias e costumes diferentes. Alguém aí quer colocar o inferno (aquele das veinhas corolas) próximo da sua residência?

Não né, ninguém quer.

E Sapiranga não quis. Ano anterior deu treta com a polícia (no outro possivelmente também). Dessa vez a prefeitura não autorizou. Eles sacaram que sem autorização ia baixar a polícia; a polícia que quando se faz presente, se faz – cada vez mais – intolerante com as diferenças. (Talvez devesse ter antropologia nos curso de formação policial. Mas só um palpite mesmo. Não quero me meter muito.)

Onde arranjaram refúgio?

Numa chácara/camping – Balneário Idone, em Capela de Santana/RS, Estrada Sanga Funda, 7780, Bairro Assentamento São José – uma área de um assentamento. Onde as relações acontecem de outro modo, em que a ideia de “comunidade” e de ecologia é mais forte. Um brinde a contracultura. As pessoas do centro, das famílias, não gostam né, mas tem que engolir.

Assim, independente de quem pode e de quem não pode ir ao evento, tem um convidado que não se proíbe. A chuva. Ninguém segura. Sempre entra onde quer ou não quer. A natureza é soberana. O quê? Esse bando de loucos reunidos aqui? Um pouco mais de chuva pra aumentar a diversão.

E Choveu. Choveu pra burro, e muito… e chove em Porto Alegre. A maior de todas as chuvas dos últimos não seis quantos anos.

A gente já sabia antes de ir. Somos colonos cibernéticos e utilizamos aplicativos meteorológicos nas enxadas.  Fomos, meio que, preparado para isso tudo. Talvez nem tanto. Por mais que você se organize e se prepare espiritualmente, não tem como se preparar para um motorista que não sabia o local do evento. Ele girou, girou até que a gente ia mais pra cá e depois voltava, depois ia de novo e girava em círculos, e de tentativa em tentativa, o que era divertido virou atraso e o que era engraçado começou ficar preocupante. Imagina, quatro bandas num micro-ônibus: Banda Repolho, Cartolas, Identidade e o Terno. E ninguém sabia onde era.

Certa altura do campeonato, levanta o Tim, da banda o Terno, e diz: o motorista passou o local da entrada. Era pra ter dobrado ali atrás! Acho que todo mundo ficou meio assim, mas o que custava deixar ele que é paulista guiar o motora gaúcho.

E ele estava certo, tinha que dobrar a direita, voltamos; daí na volta era a esquerda e acabamos indo pro lugar certo. De certeza mesmo é que o motorista não sabia aonde estava indo. Literalmente.

Quando na primeira derrapada, ele disse: Não vai. Não vou, vocês tão ficando louco, tenho que levar uma excursão pra Gramado amanhã de manhã bem cedo com esse micro-ônibus. É, ele não tinha ideia de onde tinha se enfiado.

Liga pra produção. E vem um trator.

– What?

– Isso mesmo, um trator!

Se a gente que já está acostumado se assustou. Imagina as outras bandas.

Daí vem o Paulo Zé – organizador e idealizador do evento -, não conhecia ele, (só de nome) mas já chegou pilhado e bestemando. E a primeira impressão foi: Ele é brabo; é mais do que isso, é aguerrido. E tem que ser né, pra fazer tudo isso funcionar, juntar esse bando de louco e criar uma (des)ordem pra isso tudo, tem que ser né.

Daí ele para do meu lado e pra tranquilizar o povo, diz:

– Galera, fica tranquila que está no tempo certo e a próxima banda é a Repolho e eles já estão lá prontos pra subir no palco.

E eu, do lado dele, pensei comigo, que bom né. A gente não precisa se preocupar, está tudo sob controle, porque o Repolho já vai entrar no palco.

Cutuquei ele e disse: Três dos integrantes do Repolho estão aqui e apontei pro Anderson e pro Akira. Mas não dá nada, avisa o Demétrio pra subir no palco e ir tocando “oh Regui” (música do nosso segundo disco que é um reggae) que a gente já chega lá e dá sequência no baile.

E o Paulo Zé: mas então vocês tem prioridade.

Me senti um véio de 180 anos em fila de caixa especial na lotérica pra paga uns boleto.

Acabamos pegando carona com o Teclas, tecladista da banda Identidade, ele estava de carro e foi muito gente fina, se sujeitou a levar a gente até quase a entrada do evento. Ou até onde o carro conseguiu passar. O restante tivemos que ir a pé mesmo. E o trajeto foi bonito e divertido, no escuro e patinando na lama. Até tentava encontrar um local que fosse terra firme, mas não dava pra ver nada. Nem a floresta e muito menos os duendes, os doentes da cabeça eu avistei quando nos aproximávamos do local dos shows. Uma galera reunida e se divertindo muito. Uma clima excelente.

Chegamos no camarim (coletivo), um espaço pequeno atrás do palco. E a folia rolava solta e a gente não sabia direito o que estava acontecendo e nem onde estava. Não deu tempo pra identificar o território, cumprimentar as pessoas, pois precisava subir ao palco: já fui trocando de roupa, olhei, tinha duas meninas fumando e no canto um anão (pensei que o David Lynch poderia estar por perto, mas depois fiquei sabendo que não tava ficando loco, que era o pessoal da banda que havia se apresentado antes – NADDO entre gigantes). E foi assim que a gente subiu ao palco. Sem ter tempo de conhecer as pessoas direito ou ter noção do que estava rolando.

O show foi aquela coisa de sempre. Chega num local desconhecido, tu acha que ninguém vai dar bola. Mas o público estava empolgado e reagiu bem. O som estava muito legal e toda a equipe técnica muito atenciosa pra fazer com que a coisa toda funcionasse. Contamos com a participação especial do poeta (e estilista) Diego Dourado, que fez a roupa do Demétrio, e do Leandro Blessmann, grande amigo e compositor da Benga Music.

E assim foi. Depois de tocar tudo fica mais tranquilo, dai pudemos conferir o show do Cartolas, Identidade e o Terno. Tudo muito divertido. As outras bandas muito guerreiras e disponíveis. baita shows.

E pra sair dali? Sim, outra empreitada.

Sobe todo mundo no trator.

Só pra explicar: pra chegar ou sair dali, ou a pé patinando ou de trator. Como a gente tinha que levar os equipamentos, o trator puxava uma carretinha com proteção na parte da frente e traseira. Os instrumentos foram colocados ao centro e as bandas iam: ou sentadas em volta com os pés pra fora da carretinha, ou em pé apoiadas nas barras, ou então em volta do trator.

Coisa linda de ver, aquelas 4 bandas indo em direção ao nada. Uma escuridão total. E assim retornamos para o micro-ônibus para retornar pra Porto Alegre.

Gostaria de deixar aqui registrado o agradecimento as bandas Identidade, Terno e Cartolas, pela parceria, e em especial ao Júlio Sasquat, que emprestou o pedal de bateria pro Anderson, ao Teclas pela Carona, e lógico, um mais que especial agradecimento ao Lucas Hanke (Cabelo) e ao Paulo Zé pelo convite. Que venham os próximos convites. Só o convite, porque da próxima vez não sei se vou. Tô véio demais pra andar de trator no sereno. He he he… E Vida longa ao Morrostock!


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